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Cachoeira seca |

ra uma vez, numa terra muito, muito distante, um garotinho chamado Tico, que vivia à beira de um rio, um dia tão imenso, que tinha até uma enorme cachoeira, fato que tornara aquela localidade conhecida como Rio Grande. A comunidade local se dividia em dois grupos, um ao sul e outro ao norte do territótio, Tico e sua família moravam ao norte, daí porque diziam que viviam no Rio Grande ao Norte. Mas a situação era crítica, o rio secava, a cachoeira imponente de outrora era só areia, leito seco, e o povo que dependia das águas antes caudalosas, empobrecia.
Filho de pais humildes, um pescador e uma lavadeira, muito espirituoso, metido a engraçado, um gozador de primeira linha, nas épocas áureas ora ficava com o pai nas pescarias, quando se interessava mais pelas piadas e “causos” de pescadores que propriamente aprender o ofício, ora acompanhava a mãe à beira rio, e aí sim, se afeiçoava muito na arte de botar a mão em sujeira e lavar roupa suja.
Tico nada queria “com o batente”, preguiçoso não desejava seguir profissão de nenhum dos pais, mas com eles aprendeu valores pro resto da vida, virou "expert" em contar engraçadas bravatas e tomou gosto em lidar com todo tipo de sujeira.
Devido a dificuldade de sobrevivência de sua família com a seca avassaladora, Tico precisou procupar ocupação, saiu de casa, e começou sua perenigração em outras paragens na busca do que fazer. 


Certo dia, numa cidade, depara-se com um grupo de pedreiros, num pátio de obra de construção de uma grande catedral. Tico se aproximara dos homens e passou a visitá-los diariamente, observava o trabalho e notava que esses pedreiros eram diferentes dos que conhecia, usavam aventais por cima das roupas durante o trabalho, preferiam lapidar grandes pedras até ficar na forma de grandes cubos perfeitos com que levantavam paredes, ao invés de simplesmente assentar tijolos, um árduo trabalho com malho e cinzel. Percebia que eles falavam aos ouvidos uns dos outros, algum segredo que não compreendia. Reparava também que dentre eles havia um, com mais idade, que analisava traçados que fazia numa prancheta com a ajuda de um lápis e um compasso, coordenava a obra, era o mestre de obra. Os demais pedreiros o respeitavam muito, tanto a ponto de venerá-lo e o tratarem por venerável mestre pedreiro. Tinham, portanto, um trabalho planejado e comandado por um pedreiro mais especializado, a quem muito respeitavam. 
Assíduo freqüentador da obra, Tico ficara íntimo desses pedreiros que carinhosamente começaram a lhe chamar por “Tiquinho”, coisa que agradou Tico, e o apelido "pegou"; os pedreiros deixavam-lhe fazer pequenos serviços, ganhava aos poucos confiança até se tornar membro do grupo, aprendiz do ofício. Depois de árduo dia de trabalho, costumavam se reunir numa espécie de confraternização, uma comilança com muito bom vinho e muita conversa. Tiquinho, que não gostava de trabalho, desejava na verdade ser como o mestre de obras, só coordenando, sem “pegar no pesado”, mas desfrutando dos banquetes diários. Com o tempo passou de aprendiz de pedreiro a companheiro oficial do clã, mas nunca exemplar no serviço, sempre disfarçando a preguiça com traquinagens e brincadeiras; entretanto, quanto a beber vinho e comer, aí sim, se fartava, era o primeiro.

Assíduo freqüentador da obra, Tico ficara íntimo desses pedreiros que carinhosamente começaram a lhe chamar por “Tiquinho”, coisa que agradou Tico, e o apelido "pegou"; os pedreiros deixavam-lhe fazer pequenos serviços, ganhava aos poucos confiança até se tornar membro do grupo, aprendiz do ofício. Depois de árduo dia de trabalho, costumavam se reunir numa espécie de confraternização, uma comilança com muito bom vinho e muita conversa. Tiquinho, que não gostava de trabalho, desejava na verdade ser como o mestre de obras, só coordenando, sem “pegar no pesado”, mas desfrutando dos banquetes diários. Com o tempo passou de aprendiz de pedreiro a companheiro oficial do clã, mas nunca exemplar no serviço, sempre disfarçando a preguiça com traquinagens e brincadeiras; entretanto, quanto a beber vinho e comer, aí sim, se fartava, era o primeiro.
Tiquinho passava os jantares a contar piadas de padres e a falar mal deles sem motivo aparente, e pelo sucesso que fazia, aprimorou-se, foi além, passou a falar de todo mundo pelas costas e a se especializar na arte de contar piadas de tudo; tornou-se o maior gozador e o mais infame dissimulado da paróquia, daí nascendo esse termo pra tudo que é exagerado. Enquanto o pároco contratante, ao chegar ao canteiro de obras, recebia a atenção respeitosa dos pedreiros, Tiquinho corria a adulá-lo, insinuante, falsamente modesto e brincalhão. Como era dado, diferentemente dos outros companheiros, despertava confiança e empatia, e o padre, apesar de vivido, caia em sua lábia.
Tiquinho já adulto mudava constantemente, não tinha parada, vivia de paróquia em paróquia, de obra em obra, passou por vários grupos de pedreiros, aplicava sua lábia aqui e acolá e aos poucos, foi ficando mestre de obras deles todos. Entretanto, vaidoso, logo percebeu que não conseguiria ter muito futuro apenas chefiando esses grupos, não ganharia o prestigio que desejava e, refletindo, vislumbrou algo maior, algo de mais poder, que valeria a pena buscar, não por algum ideal específico, mas para ter o prestígio que aplacaria o recalque que trazia por sua vidinha vazia, medíocre, de mestre de pedreiros sem objetivos nobres e palpáveis.
Começou a sonhar com a Grande Associação dos Pedreiros, a instituição regulamentadora da atividade que abraçara há anos, de onde almejava ter às mãos seus vastos recursos para serem usados em prol da sua vaidade incontida. Iniciou um longo planejamento para um dia ter acesso a isso tudo, onde concluiu só seria possível se conquistasse a chefia da Grande Associação, o cargo de Grande Mestre Pedreiro. Deixou de trabalhar nas oficinas de construção, iniciou uma peregrinação por todo canto onde houvesse pedreiros reunidos, foi conquistando-os com piadas e deboches, colocou em ação o maior gozador em que se tornara e toda a experiência acumulada ao longo dos anos de aprendizado de manipulação, de oportunismo e de dissimulação.
Em campanha, depois de muita persistência, finalmente, talvez por falta de opções, por sorte ou por obra do destino, sagrou-se O Grande Mestre Pedreiro, o dirigente da Grande Associação dos Pedreiros. No poder, tornou o mandatário mais engraçado de todos os tempos, como não poderia ser diferente, pois a única coisa que Tiquinho sabia fazer bem era ser engraçado. Aos poucos aprendeu o funcionamento da máquina, deslumbrou-se com a mordomia, deliciou-se com a bajulação, iludiu-se com a consideração e carinho que todos bajuladores lhes dispensavam. Ficou impressionado, quase hipnotizado, com o montante de dinheiro que passava pelas suas mãos, recursos que lhe confiaram os pedreiros associados da Grande Associação. Iniciou um plano bem arquitetado para melhor proveito de tudo isso: num primeiro momento procurou demonstrar à comunidade de pedreiros, que praticava uma administração tão austera a ponto de beirar a sovinice, para depois, conquistada a confiança, inventar projetos de alto custo para poder projetar seu alto ego.
Essa manobra se viabilizou com facilidade porque tradicionalmente ninguém se contrapunha aos projetos dos Grandes Mestres Pedreiros, e, além disso, já havia conquistado a reputação de economicidade na gestão, de “pão-durismo”, tinha a confiança cega da maioria e poderia tocar todos os projetos por mais que os críticos provassem serem absurdos; poderiam vir viagens inúteis, reformas de reformas, compras de terras para nada de proveitoso, fantasias, despesas perdulárias travestidas de investimento social, qualquer coisa que os pedreiros acatariam, tinham sua confiança. Alguns poucos logo perceberam para o que Tiquinho desejava o poder: ser o Grande Mestre Pedreiro, apenas pelo poder que lhe daria mordomia, bajulação e muito dinheiro para o exercício de seu vaidoso poder. Ideal nenhum, pois nada ocorrera de útil, de marcante, de conseqüente e transformador durante todos os anos que ficara à frente do comando da Grande Associação.
Como os associados recebiam migalhas da sua rica Grande Associação, acreditavam que o Grande Tiquinho estava preservando e aumentando o tesouro comum de todos, sem suspeitar que o incompetente e mal intencionado Grande Mestre Pedreiro estava reservando os polpos recursos para projetos sociais sem benefício marcante para os membros filiados na associação, travestindo mesquinharias em economia e gastando fortunas com projetos faraônicos cujos benefícios eram só para inflar o seu próprio ego, nada para a comunidade. Sem conteúdo, sem equipe, sem preparo para o governo da instituição que ocupara, sentia-se perdido e, principalmente, desesperado por idéias de alguma ação que marcasse sua passagem pelo poder; sem ninguém a seu lado para apresentar bons projetos ou pelo menos para frear as bobagens que inventava, apareciam obras perdulárias e inúteis, transformando a gestão de inócua a dilapidadora do patrimônio dos pedreiros.
• ...os pedreiros artesãos, vencida sua gestão, iludidos que estavam por sua lábia, achando que seu mandato era o máximo, recolocaram Tiquinho novamente no comando da associação;
• ...os pedreiros laboriosos continuavam acreditando ingenuamente que o importante era se incomodarem apenas com suas vidas nos seus trabalhos, nos seus grupos, nas obras de suas paróquias, não interessando os assuntos da Grande Associação, algo como ficar no micro e não no macro;
• ...os pedreiros da paz achavam melhor fugir de brigas, de intrigas, cuidar da própria vida, crendo que as coisas se resolveriam por si; desejavam harmonia e acreditavam que ficando longe dos problemas esses deixariam de existir;
• ...os pedreiros inconseqüentes acreditavam que o silencio e a boa fé cega os protegeriam; infelizmente isso depois ficou provado que era tão verdade quanto se protege o avestruz ao enterrar a cabeça frente às adversidades;
Esqueciam-se os pedreiros que o local e o geral não se distinguiam, tudo era patrimônio de todos, e por todas as coisas dessa estrutura criada respondiam todos, pelos acertos e erros.
Tiquinho medíocre sabia que não tinha capacidade para fazer o que era devido no cargo de Grande Mestre Pedreiro, mas astuto que era, sabia que nunca deixaria sua marca por feitos transformadores que se esperaria do comandante da Grande Associação, por isso precisava continuar vagando como zumbi por todo canto, fumando seus cigarrinhos nos copos d'água, fazendo suas micagens, todos os dias, pelas paragens mais distantes onde houvesse pedreiros reunidos, porque para ser lembrado só mesmo se fazendo presente com piadas, com deboches e gozações atualizadas; se dependesse de feitos da sua administração...
E Tiquinho, contando com a imobilidade, com a evidente cegueira e conivência impensada de não envolvimento dos seus companheiros pedreiros bons de coração, mas ingênuos, foi aproveitando, vivendo a sina de continuar na estrada feito andarilho que não podia parar porque não sabia fazer outra coisa, só andanças, palanque, brincadeiras e gastanças camufladas de economia; não tinha preparo e não sobrava tempo para juntar pessoas para projetar feitos utilitários perenes para os pedreiros e para a humanidade; defendia-se dos críticos do lixo de seu governo procurando destruí-los, perseguindo-os em suas prerrogativas com atos violentos, desonestos e sem ética; tudo em surdina, escondidinho, como se não fosse atos seus; não mais construía templos, só sobrou para si só os comes, os bebes, conversações movidas a piadas e falação dos outros... nas altas horas por ai.
E o povo bom, alguns não, mas a maioria, silenciava com palmas.
Moral da História:
“O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons.”
Martin Luther King
Ir. Edson Monteiro
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